Devolutiva à entidade sobre o IV Encontro Nacional de Agroecologia: Avaliações e desafios

Devolutiva à entidade sobre o IV Encontro Nacional de Agroecologia: Avaliações e desafios

ASSOCIAÇÃO DE GEÓGRAFOS BRASILEIROS SEÇÃO LOCAL VIÇOSA E GT AGRÁRIA RIO DE JANEIRO E NITERÓI

Isabela Pasini e Pedro D’ Andrea

Entre os dias 31 de maio a 03 de junho de 2018 mais de 2.000 pessoas estiveram reunidas no Parque Municipal de Belo Horizonte, MG, para a realização do IV Encontro Nacional de Agroecologia, defendendo o lema “Agroecologia e Democracia: unindo campo e cidade”. Reproduzindo a notória diversidade étnica, cultural e indenitária existente em nosso país, estiveram presentes neste espaço 31 etnias indígenas, povos quilombolas, agricultoras/res familiares, extrativistas, pescadoras/es artesanais, faxinalenses, camponesas/es, quebradeiras de coco, povos tradicionais de matriz africana e povos de terreiro, vazanteiras/os, caatingueiras/os, geraizeiras/os, sertanejos/as, faxinalenses e seringueiros/as que compuseram cerca de 70% do total de participantes do Encontro. Somada a esta rica diversidade de participantes estavam presentes, ainda, pesquisadoras/res, extensionistas, estudantes e educadoras/res. Esta pluralidade era constantemente expressa através das diversas formas de plantar, comer, curar, dançar e cantar desde os espaços de circulação do Encontro, passando pela Feira de Saberes e Sabores e pela Feira da Agrobiodiversidade, pela Tenda da Saúde, nas apresentações artístico-culturais até os espaços de discussão e debate.

Os sentidos políticos que marcaram a construção do IV ENA passaram por três pontos centrais: i) dar visibilidade as lutas encampadas nos territórios, onde a agroecologia é evidenciada a partir da ação dos homens e mulheres que através destas práticas apontam para a construção de um projeto de sociedade contra-hegemônico; ii) dar protagonismo ao papel das mulheres, juventudes, dos “sujeitos coletivos das florestas, das águas, dos campos e das cidades”, enquanto sustentação do movimento agroecológico; e iii) aprofundar os campos de debate e ação que permeiam a relação cidade-campo, fortalecendo o movimento agroecológico urbano enquanto elemento capaz de agregar subsídios à ressignificação do direito à cidade.

Através destes sentidos foram construídos quatro objetivos que orientaram o IV ENA: i) demonstrar para diversos setores da sociedade os benefícios concretos da agroecologia, como: produção de alimentos livres de agrotóxicos e transgênicos, recuperação e conservação dos rios e fontes de água, da biodiversidade, florestas e solos, democratização do uso da terra, geração de trabalho e renda, sendo estes elementos produzidos através de uma ampla diversidade de identidades e culturas; ii) denunciar o desmonte de políticas públicas e as constantes violações de direitos, buscando o apoio de amplos setores na defesa da Reforma Agrária, dos territórios dos povos e comunidades tradicionais e o fortalecimento da agricultura familiar, camponesa e urbana; iii) ampliar e fortalecer a articulação dos movimentos, instituições e organizações que estão envolvidos na perspectiva agroecológica, buscando consolidar valores emancipatórios como o feminismo, contra o machismo e o patriarcado, em favor do direito das juventudes, contra o racismo e o etnocídio; e iv) afirmação do sentido estratégico e político da comunicação e da cultura enquanto direito, frente ao monopólio da comunicação e o ataque conservador à diversidade cultural.

É notória a relação entre a ciência geográfica e a agroecologia que no IV ENA se fez presente, entre outros elementos, nos diversos temas debatidos nos seminários temáticos, como: biodiversidade: bem comum, soberania alimentar e territorial dos povos do Brasil; educação do campo; mudanças climáticas; agrotóxicos e transgênicos; direito à terra e ao território; agricultura urbana e direito a cidade; agroecologia e seu papel na defesa da água enquanto bem comum. Considerando que a geografia atravessa esta multiplicidade de temas (nos campos teórico e prático), percebemos que a bandeira da agroecologia ainda é muito tímida dentro da AGB, enquanto entidade nacional. Isto se expressa, por exemplo, na ausência da própria palavra nas ementas dos eixos temáticos do XIX Encontro Nacional de Geógrafos, assim como do XVIII ENG. Isto não quer dizer que as Seções Locais e os GT’s não estejam articulados e em diálogo com a temática. Existem seções locais que tem ações junto ao movimento agroecológico local, debatendo e atuando nesse campo. Inclusive a participação no IV ENA foi fruto desses envolvimentos, estando algumas seções inseridas em seu processo de construção. Vemos assim, que, aos poucos, cresce o envolvimento temático e prático da agroecologia na entidade.

Diante da conjuntura nacional de golpe, retrocessos, perda de direitos e ameaças a nossa democracia, o movimento da agroecologia buscou neste ENA realizar uma aproximação com os movimentos de diversos setores e áreas como, por exemplo, ligados à mineração, à educação a moradia, entre outros, incluindo a AGB. Após nossa participação no IV ENA, reforçamos a ideia de que a Agroecologia, enquanto ciência, movimento e prática, deve ser fortalecida e que nós, geógrafos/as, temos muito a contribuir nesse fortalecimento. Além disso, compactuamos com o princípio de que, no contexto nacional atual, é necessário nos unirmos aos movimentos que estão no campo de luta pela democracia brasileira e contra os retrocessos e ascensão dos grupos conservadores e fascistas. Através da AGB, percebemos dois caminhos principais nessa caminhada: a aproximação ou estreitamento dos laços através dos GTs e /ou Seções Locais, na escala local, estadual, regional; e uma aproximação institucional em escala nacional. A primeira se daria assim a partir de interesse e autonomia das locais, considerando suas trajetórias e contextos locais. A segunda se daria através da aproximação, principalmente, da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA)1 e Associação Brasileira de Agroecologia (ABA)2 , a primeira sendo a entidade que congrega as diversas organizações e movimentos do campo agroecológico, com o caráter de articulação política, e a segunda sendo a entidade que congrega os diversos sujeitos do campo acadêmico/científico do campo agroecológico.

Em 2017, já houve uma aproximação da ABA com a AGB a fim de entender o processo de construção coletiva dos ENGs como inspiração para tornar os Congressos Brasileiros de Agroecologia, construídos pela entidade, mais democráticos e participativos. Este ano, a ANA convida a AGB a participar do Encontro Nacional de Agroecologia, encontro este construído pela Articulação. Sugerimos assim, que, continuando a aproximação, representantes da ANA e ABA participem do XIX ENG, ampliando nossas possibilidades de diálogo e compreensão de possíveis parcerias. Os povos do campo e os movimentos sociais (do campo e da cidade) tem pautado e produzido a Agroecologia dentro de seus territórios e, a partir disso, têm se articulado entre si, através de ANA e outros espaços, entendendo que esta reúne elementos práticos e epistemológicos capazes de propor e construir um outro modelo de sociedade. Nesse sentido consideramos fundamental a AGB refletir: De que maneira a geografia brasileira irá pensar e fazer a agroecologia no século XXI?

1 “A Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) é um espaço de articulação e convergência entre movimentos, redes e organizações da sociedade civil brasileira engajadas em experiências concretas de promoção da agroecologia, de fortalecimento da produção familiar e de construção de alternativas sustentáveis de desenvolvimento rural. Atualmente a ANA articula vinte e três redes estaduais e regionais, que reúnem centenas de grupos, associações e organizações não governamentais em todo o país, além de quinze movimentos sociais de abrangência nacional” (www.agroecologia.org.br). 2 “A Associação Brasileira de Agroecologia reúne profissionais e estudantes das mais diversas áreas do conhecimento” (http://aba-agroecologia.org.br/wordpress/). A ABA é uma das entidades que compõem a ANA.

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